Sonhos é uma coletânea do cinco últimos textos que eu criei. Começarei postando aqui "A colher de pau" mais simples, e o preferido pelo Ícaro que leu quatro dos cinco. Espero que curtam. Postarei de 1 a 2 por semana, e em breve começarei uma nova série, por enquanto intitulada "Presos"
A Colher de Pau
“Não, eu não
quero... para com isso pai, para mãe. Vocês não gostam de mim?” O menino
chorou.
O casarão colonial pode ter sido a casa mais
linda de todo o bairro do pequeno menino, durante o século 18. Sua estrutura
colossal cedeu ao tempo. Era fácil de notar pelo reboque despedaçado, o
amarelado que marcavam até onde algumas inundações ocorreram ali, quartos sem
janelas e algumas janelas sem quartos. No que sobrou dos dois andares, via-se
algo que tentava lembrar a beleza arquitetônica de todas aquelas construções
míticas do barroco. Mesmo assim, parte da casa era só escombros, outra parte,
escuridão.
“Papai, você
sempre foi meu herói, porque quer que eu pegue a colher de pau que o cachorro
levou la dentro sozinho?” Não houve resposta. Após alguns segundos de trocas de
olhares, o menino desistiu de tentar convencer seu pai a ir la dentro com ele.
“Não tenha medo...” era o pedido da
casa. Sua mãe não se intrometeu...
‘Eles não
querem eu por perto, todos que entram la desaparecem, por que eles querem que
eu desapareça. Eu amo eles, tanto...’ O menino cedeu e partiu para sua jornada
preta e branca.
A porta de
entrada tinha cinco vezes seu tamanho .
Ela se manteve trancada durante toda a vida do menino, mas assim que ele
se aproximou ela abriu sozinho.
‘’Sinta-se
vontade, não te farei mal se você for uma boa pessoa aqui dentro.’’ A voz soava como de uma menina, nem criança
nem adulta, mas ele sabia que era a casa.
Apesar de
toda boa receptividade, o menino tremia, suava frio, seus passos curtos de uma
criança de 6 anos se tornavam mais curtos e pesados cada vez que adentrava mais
no salão de recepção.
“Por que
tanto medo, criança? Ou é tristeza, não sei o que observo em seus olhos
inocentes.”
Ele sabia que não voltaria mais, uma infinidade de crianças já desapareceram lá dentro antes dele. Ele sabia que era isso que seus pais queriam.
Ele sabia que não voltaria mais, uma infinidade de crianças já desapareceram lá dentro antes dele. Ele sabia que era isso que seus pais queriam.
‘Mas eu os
amo...’ era o seu pensamento principal.
De repente
um latido. Descia a escada que levava ao segundo andar o seu cachorrinho. “Por
sua culpa meus pais não me querem mais, cade a colher de pau!??” Olhou com
raiva para o cachorro, que se encolheu e parou de abanar o rabo na hora.
“Não o
culpe, pequena criança. Ele é só um cachorro, não é nada diferente de você.
Também foi abandonado pelos pais, mas você faz ele se sentir bem. E aqui ele te
entende perfeitamente” A criança não sabia o que dizer, começou a chorar e
correr pra fora, mas já era muito tarde, estava totalmente escuro , seus pais
haviam partido.
A noite era
escura, não havia lua, não havia estrelas
nem algum outro tipo de luz artificial ali perto. O preto e branco da
casa era muito mais convidativo àquilo.
“Eu sempre
fui um bom menino... sniff” .
Lá dentro
ele se acomodou num canto no andar de baixo, não havia nenhum outro móvel
dentro da casa.
O seu
vira-latas desceu com a colher de pau assim que o menino apagou e se ajeitou do
lado dele. “Não é culpa minha... me desculpa.” E ficou la durante algum tempo.
Quando o
menino acordou no meio daquele nada com paredes parecendo que ia despencar em
sua cabeça, notou que estava mais alto, mais velho, suas roupas de criança
jaziam rasgadas no chão. Confuso.
‘O que
aconteceu? ‘ Passou a mão em seu rosto e notou que havia crescido alguma barba.
Estava pelado porém não sentia frio. Então ele lembrou da colher de pau e
resolveu subir a escada.
“Que bom que
você levantou, garoto. Já está durmindo ai durante anos...” - a voz da casa era
a mesma- “Existem outros que nunca se levantaram...”
Ele não
respondeu a voz, preferiu continuar subindo as escada e procurar a colher de
pau.
“Seu cachorro desceu a colher de pau, infelizmente a umidade e o tempo em que ela ficou ai a destruiu. Não há nada em cima como não há embaixo, a colher esta de baixo de suas roupas de criança...”
Assim que ele terminou de subir, ele viu outro cachorro mordendo outra colher de pau. Esse não era o seu cachorro e o cão até rosnou pra ele. Vindo lá de baixo, ele escutava uma voz de criança, chorando, implorando para seus pais não deixarem ele entrar na casa sozinho. A mesma coisa que ele passou sabe-se lá quantos anos atrás. Ele lembrou de tudo
“Seu cachorro desceu a colher de pau, infelizmente a umidade e o tempo em que ela ficou ai a destruiu. Não há nada em cima como não há embaixo, a colher esta de baixo de suas roupas de criança...”
Assim que ele terminou de subir, ele viu outro cachorro mordendo outra colher de pau. Esse não era o seu cachorro e o cão até rosnou pra ele. Vindo lá de baixo, ele escutava uma voz de criança, chorando, implorando para seus pais não deixarem ele entrar na casa sozinho. A mesma coisa que ele passou sabe-se lá quantos anos atrás. Ele lembrou de tudo
Num ataque
de fúria, ele pulou em cima daquele cachorro e roubou a colher de pau do mesmo.
Com um ataque, ele quebrou o crânio do cachorro e a colher... o cachorro morreu
e ele passou a andar sobre quatro patas, os latidos passaram ser sua única
palavra, mas ele entendia tudo o que a criança falava e o que a casa falava.
Num canto daquela mesma sala de cima, ele viu os ossos de outro cachorro, jazia ali a muito tempo, seu coração doeu, eram os ossos do cachorro dele... então ele tentou se aproximar da nova criança que o xingou, o rejeitou, tacou uma pedra nele. Na noite, ele levou a colher de pau quebrada lá pra baixo, desculpou-se com o menino, sabendo que o destino dele seria o mesmo que o seu, subiu as escadas e esperou seu fim...
Num canto daquela mesma sala de cima, ele viu os ossos de outro cachorro, jazia ali a muito tempo, seu coração doeu, eram os ossos do cachorro dele... então ele tentou se aproximar da nova criança que o xingou, o rejeitou, tacou uma pedra nele. Na noite, ele levou a colher de pau quebrada lá pra baixo, desculpou-se com o menino, sabendo que o destino dele seria o mesmo que o seu, subiu as escadas e esperou seu fim...
“Você só
precisava ser um menino bom aqui dentro e tudo daria certo...”